segunda-feira, 15 de abril de 2013


A Política Pública para a Criança e o Adolescente: Constituição de 1988 e o Estatuto


O artigo 227[i] da Constituição de 1988 foi introduzido como resultado de mobilização social dos movimentos de valorização e de garantia do desenvolvimento da criança e do adolescente. Esse artigo constitucional abriu espaço para a normatização de uma lei específica que regulamentou a ação das políticas públicas para as crianças e adolescentes. Nasceu, nesse contexto, a Lei 8069/90 denominada Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Essa lei quebra "o aparato sustentador das leis anteriores de situação irregular e caminha para um novo estado de direito, passando a ser dever da família, do Estado e da sociedade o cuidado da criança e do adolescente" (Castro e Nascimento, In: Alves e Carvalho, 2009). Assim, a "situação irregular" não é mais da criança ou do adolescente, mas das instâncias que deveriam garantir condições para preservação dos seus direitos, bem como da suas possibilidades de sujeito em pleno desenvolvimento. Ou seja, além da universalização que é um princípio constitucional, a constituição federal de 1988 na matéria criança e adolescente determina como prioridade absoluta das políticas públicas.

Para a efetivação e implementação de políticas voltadas para a proteção integral da criança e adolescente, o ECA determina em seu Art. 86 que a política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente deverá ser efetivada por meio de um conjunto articulado de ações, governamentais e não-governamentais de todas as instâncias do Poder Público (União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios). A política de atendimento estabelecida pelo Estatuto apresenta como diretrizes[ii], dentre outras: a municipalização do atendimento e a criação de conselhos municipais, estaduais e nacional dos direitos da criança e do adolescente. Esses aspectos encontram os conceitos de descentralização e participação debatidos até esse momento.

Os Conselhos de Direitos são órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os níveis e são órgãos vinculados ao Poder Executivo. Nesse espaço é necessário assegurada a representação da participação popular por meio de representantes de organizações representativas e governamental, representado pelo corpo mandatário, de forma paritária. Os Conselhos Municipais de Direitos da Criança e Adolescente (CMDCA) são constituídos por membros da sociedade civil que são indicados por organizações representativas da temática. Conta-se também com representantes do governo municipal que são indicados pelo prefeito, bem como por funcionários técnicos e administrativos do Estado.

A viabilização dos Conselhos de Direitos se dá por meio da garantia do espaço de participação do cidadão na definição das ações de atendimento às crianças e adolescentes. Dar-se-á também com a co-responsabilidade entre governos e cidadãos na construção de políticas públicas concernentes às reais necessidades de cada município, de cada comunidade. Aqui se estabelece a dimensão comunicacional no âmbito do Conselho, já que tanto o papel de escuta social, quanto a representação podem ser realizadas nesse espaço.

Com base nessa escuta e associada a dimensão tecnológica, o CMDCA tem a competência para tomar decisões e deliberar acerca de regulamentação e execução (monitoramento) da política de atendimento às crianças e adolescentes. Sua atuação é fundamental para a promoção, orientação e execução de políticas públicas voltadas para a criança e adolescente.

O Conselho tem a prerrogativa de construir uma Política Municipal de Proteção Integral para Crianças e Adolescentes, tendo em vista a prioridade da criação e manutenção de um Sistema Municipal de Atendimento que articule e integre todos os recursos municipais. Para tanto é fundamental a participação ativa do Conselho na elaboração da Lei Orçamentária do município com o papel de garantir que dotações orçamentárias sejam destinadas às políticas públicas na área da infância e juventude, fazendo cumprir o princípio constitucional da absoluta prioridade. Contudo, esse ponto é um dos recursos agregados no conceito de tecnologia de maior dificuldade para a realidade da co-gestão.

Além do orçamento, que deve ser destinado às políticas assistenciais e básicas, o Conselho tem o Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente[iii] que é destinado a financiar a criação de um Sistema Municipal de Atendimento. Esse sistema deve contemplar as políticas de medidas sócio-educativas, a criação de diagnósticos, as atividades de formação dos conselheiros e de comunicação com a sociedade. Os recursos do Fundo ainda são muito pouco utilizados demonstrando uma incapacidade arrecadatória e uma visão planejada da política para a criança e o adolescente.

Outro espaço para a garantia do direito das crianças e do adolescente é o Conselho Tutelar. Esse conselho congrega os três eixos de sustentação do ECA: promoção, controle e defesa da criança e do adolescente. Em outras palavras, constitui a instância privilegiada para a visibilidade da atuação do Estatuto. O Conselho Tutelar é um espaço fundamental para a reordenação da estrutura social, da política social e das instituições, pois é a instância que pode intervir na privacidade das famílias e, ao mesmo tempo, nas instâncias de poder, para garantir o atendimento da lei.

Pelo que dispõe o Estatuto, o Conselho Tutelar possui amplitude e alcance no âmbito municipal para exercer seu papel de operacionalizar o ECA. Tem o poder de fazer valer as políticas públicas no que diz respeito à infância e a adolescência, não só assessorando sua elaboração, mas também assegurando seu cumprimento. A eleição dos conselhos ocorre por via direta e aberta a toda a população. Aqui assenta-se a dimensão da participação que foi falado anteriormente, uma vez que candidatos comunitários poderiam ter melhor resultados no pleito. Torres, Tatagiba e Pereira (In: Kayano e Sícoli, 2009) reconhecem a possibilidade de manipulação por esse tipo de pleito. Por sua vez, compreendem o possível retrocesso se fosse diferente.

As estruturas dos conselhos para a área da criança e adolescente estão em cerca da totalidade dos municípios no Brasil (IBGE, 2010). Segundo a pesquisa de Informações Básica Municipais, em 2009, 91,4% dos municípios brasileiros possuíam Conselhos de Direitos[iv]. Contudo, desse total somente 86,5% tem caráter deliberativo, fato que demonstra uma desconsideração dos requisitos legais estipulados pela Constituição. Esse mesmo percentual demonstra que os Conselhos do Direito da criança e adolescente estão vinculados ao órgão gestor da assistência social.

O Fundo do Direito da Criança e do Adolescente ainda é menos difundido no território brasileiro. Cerca de 60% do total dos municípios dispõem de Fundo. Tal fato demonstra um potencial ainda não explorado de arrecadação de recursos no contexto brasileiro. Por sua vez, demonstra também, que em número absoluto, boa parte dos municípios brasileiros não encontra potencial para desenvolver ações de captação de recursos já que a estrutura produtiva local ainda é incipiente.

O número de Conselhos Tutelares nos municípios brasileiros já alcança a quase totalidade. 98,35% dos municípios no Brasil já têm estrutura tutelar para a área da criança e do adolescente[v]. Os Conselhos Tutelares em sua maioria também encontram-se vinculado à área da Assistência Social, assim como os Conselhos de Direito.






[i] Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.


[ii] Art. 88 do ECA.


[iii] O Fundo do Direito da Criança e do Adolescente somente foi regulamentado em resolução CONANDA de número 137 no ano de 2010.


[iv] Dos 5565 municípios do Brasil, 5084 têm Conselho do Direito da Criança e do Adolescente.


[v] Dos 5565 municípios do Brasil, 5472 têm Conselho(s) tutelar(es).

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