sábado, 11 de maio de 2013

Narradores de Javé



Conta a história dos moradores do vilarejo do Vale de Javé e o temor destes: uma represa que precisa ser construída e com isso a cidade de Javé será alagada. E para impedir tal fato, a única chance que eles têm é a de provar que a cidade possui um valor histórico a ser preservado. Para isso, precisam colocar por escrito os fatos que só são contados de boca a boca, de pai para filho. Como a maioria dos moradores são analfabetos, para preparar um documento contando todos os grandes acontecimentos heroicos de sua história, então, recorrem ao ex-carteiro da cidade. Um homem banido por todos, que para evitar que o posto de correios do lugar seja fechado começa a escrever cartas para pessoas de outras cidades e conhecidos seus, contando mentiras e calúnias dos habitantes da cidade, para poder assim gerar movimento na agência, e evitar o fechamento da mesma (e assim, preservar o seu emprego). Assim, o malandro Antonio Biá é convocado pelo povoado do Vale de Javé a pôr na escrita as histórias, contadas há anos pelos moradores, sobre a fundação da cidade, os personagens grandiosos e cheios de virtude que habitavam suas lembranças. Neste caminho, Biá vai conhecendo a fundo as fantasias, as memórias e as lembranças do povo de Javé. Mas a escrita destas histórias, tão diferentes umas das outras, não estava fácil. Biá, por mais talentoso que fosse na "regras da escritura" teve muitas dificuldades para pôr no papel as histórias de grandeza daquele povo, as quais não obtiveram registro oficialO mais interessante em discussão nesse filme é a oposição que ele traz entre história, memória e verdade – todas ligadas à cultura oral. Esses três conceitos norteiam os discursos dos personagens, as falas bem humoradas e sarcásticas de Biá – uma espécie de malandro irônico e anárquico descrente de pudores – e, principalmente, os relatos em tom de fábula dos moradores, que não conseguem se entender entre suas versões. Enquanto vamos ouvindo e nos divertindo com os casos contados – a verdadeira fundação de Javé, o papel e a forma da morte de Indalecio, seu fundador, e da participação de Mariadina; a eterna briga entre os irmãos, conhecidos um como “Gêmeo” e o outro como “O Outro”, para saber quem é o pai de cada um e a legitimidade da herança Assim, a História como ciência vai sendo “desforjada” com tamanha facilidade e destreza. Nas palavras de Biá estão a ciência e a invenção (em todo momento ele fala em nome de um saber científico), e em seu texto histórico, como propõe ao morador, certamente elas irão se confundir. No final, saber o que é verdade ou não perde a razão de ser, e o produto – dito histórico.Somente uma ameaça à própria existência pode mudar a rotina dos habitantes do pequeno vilarejo de Javé. É aí que eles se deparam com o anúncio de que Javé pode desaparecer sob as águas de uma enorme usina hidro-elétrica. Em resposta à notícia devastadora, a comunidade adota uma ousada estratégia: vão preparar um documento contando todos os grandes acontecimentos heróicos de sua história, para que Javé possa escapar da destruição. Como a maioria dos moradores são analfabetos, a primeira tarefa é encontrar alguém que possa escrever as histórias. Em Narradores de Javé, os próprios moradores se tornam historiadores, e os depoimentos cedidos estão permeados de parcialidade e louvor a esse ou aquele herói fundador, conforme parentesco ou mesmo devaneios de quem conta. Por sua vez, esses depoimentos devem passar pelo aval de um outro morador (Antônio Biá), que por saber escrever, é o historiador-cientista, aquele que supostamente pode transformar as “mentiras da história oral” em “verdades da história oficial”. O embate entre a ciência e o imaginário popular é constantemente trazido à tona pelo Heródoto-Tucídedes do filme, que em uma frase-chave ilustra todo o embate entre as frentes de opinião:
O papel dos pesquisadores era coletar dados que comprovassem que Javé
Possuía patrimônio histórico e cultural que corroborasse o tombamento de Javé,impedindo sua destruição,vale ressaltar que o tipo de pesquisa utilizada foi a
Mista (quali-quant) Permitindo a integração de duas metodologias de natureza diferente em que ambas mantém as suas qualidades intrínsecas,os dados foram coletados em todos os contextos,tempos e pessoas sugeridos pelo delineamentos da pesquisa ciêntifica,assim os moradores,por exemplo,constituem um população pelo menos um característica comum,são os habitantes,do mesmo modo que estuda um grupo cultural através de emtrevista. Na coleta do primeiro relato "javelico", Biá diz à sua "fonte": "uma coisa é o fato acontecido, outra é o fato escrito". Esse pequeno conjunto de elementos já é suficiente para apontar a isenção e a imparcialidade impossíveis à História e ao historiador. O filme se desenrola com a difícil tarefa para Biá: reunir uma história a partir de cinco versões diferentes - uma multiplicidade de fragmentos, memórias incompatíveis entre si. O personagem se vê entre essa impossibilidade e um futuro/progresso destruidor e irremediável.



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